Amazônia inspira possível remédio contra AVC
Surge um novo candidato a medicamento pode representar um avanço no enfrentamento de uma das maiores preocupações da saúde pública: o acidente vascular cerebral (AVC). O composto, batizado de ST-165, é produzido a partir do óleo de gergelim, a mesma semente usada em pães, pratos e óleos culinários. Diferente de um “elixir da floresta”, trata-se de um extrato padronizado que, em testes com animais, conseguiu reduzir lesões cerebrais e agora se prepara para os primeiros estudos em humanos.
O impacto de um fármaco capaz de minimizar os danos do AVC seria enorme. No Brasil, são registrados cerca de 400 mil casos por ano, com aproximadamente 80 mil mortes, além de milhares de pessoas que convivem com sequelas permanentes. Apesar da relevância, a busca por substâncias neuroprotetoras tem acumulado insucessos: mais de cem moléculas já foram testadas sem sucesso. Uma das tentativas mais recentes, o nerinetide, chegou a ser avaliada em 400 pacientes de nove países, mas não apresentou eficácia em comparação com placebo.
O ST-165 surgiu a partir de pesquisas do professor Walace Gomes Leal, da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa). Ele investigava se a biodiversidade amazônica poderia oferecer substâncias naturais capazes de conter a expansão da lesão cerebral provocada pelo AVC. Após analisar diferentes plantas da região, identificou no gergelim efeitos promissores: redução significativa da área afetada, melhora funcional e motora, além da diminuição de processos inflamatórios e oxidativos. O extrato também mostrou potencial preventivo em experimentos com animais tratados dias antes da indução do AVC.
O diferencial desse composto está na sinergia de suas moléculas. As lignanas presentes no óleo de gergelim atuam em várias frentes ao mesmo tempo, reduzindo inflamação, estresse oxidativo e morte celular. Essa estratégia contrasta com as tentativas anteriores, que buscavam bloquear de forma isolada receptores de glutamato — o principal neurotransmissor excitatório do cérebro. Embora esses bloqueadores tenham apresentado resultados positivos em roedores, em humanos provocaram efeitos adversos graves, como alucinações. O novo fitoterápico se distancia dessa abordagem porque não interfere diretamente na neurotransmissão fisiológica, mas atua nos mecanismos secundários que ampliam o dano cerebral.
Segundo os pesquisadores, falta apenas um estudo de segurança de longo prazo em animais para que o pedido de autorização à Anvisa possa ser feito. Para viabilizar essa etapa, será necessário captar investimentos que podem variar entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões. Enquanto isso, está previsto para o próximo ano o lançamento de um nutracêutico preventivo, também derivado do gergelim, que deve ajudar a sustentar financeiramente a pesquisa até a possível chegada do medicamento ao mercado.
O projeto já consumiu cerca de R$ 3,6 milhões, metade financiada pela Embrapii, entidade ligada ao governo federal que apoia iniciativas de inovação. A outra parte veio de aportes privados e do esforço conjunto da startup Neuroprotect e do próprio Cienp. Mesmo enfrentando dificuldades financeiras, a iniciativa conseguiu avançar e agora busca novos parceiros para transformar o potencial do gergelim em uma alternativa concreta contra os efeitos devastadores do AVC.
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