Motta e Alcolumbre se afastam e Congresso entra em turbulência

Motta e Alcolumbre se afastam e Congresso entra em turbulência

Eleitos em 1º de fevereiro com forte articulação conjunta, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), já não demonstram o mesmo alinhamento político dos primeiros meses de gestão. A distância entre os dois começou a se evidenciar após a derrubada da PEC da Blindagem no Senado, movimento que desagradou profundamente deputados da base de Motta.

Apesar de continuarem trocando mensagens e participando dos mesmos eventos, parlamentares reconhecem que a sintonia se perdeu. Antes, decisões eram combinadas nos bastidores; agora, cada Casa tem atuado de forma independente, o que já impacta a tramitação de propostas e provoca acúmulo de matérias paradas entre Câmara e Senado.

Integrantes do centrão avaliam que a falta de coordenação enfraquece o Legislativo em disputas com outros Poderes. Há preocupação de que o distanciamento entre Motta e Alcolumbre transforme debates internos em um conflito institucional mais amplo. Por isso, aliados tentam reduzir o clima de tensão.

Entre os deputados, ainda há ressentimento pela queda da PEC da Blindagem — proposta que impedia a abertura de inquéritos contra parlamentares sem aval do Congresso. Para líderes da Câmara, a derrota representou desgaste político direto para Motta, que havia prometido entendimento prévio com o Senado. Com a repercussão negativa e os protestos populares, senadores encaminharam a PEC para uma comissão, onde ela foi rejeitada por unanimidade.

Nos bastidores, deputados cogitam reagir travando projetos de interesse dos senadores ou recusando mudanças feitas pelo Senado em propostas que retornarem à Câmara. A reforma tributária, por exemplo, voltou para análise dos deputados após ajustes dos senadores e pode se tornar palco desse embate.

No Senado, também há incômodo acumulado. A mudança regimental promovida na gestão Arthur Lira, que tirou a prioridade de projetos iniciados pelos senadores e passou a favorecer matérias mais antigas de autoria de deputados, continua sendo motivo de atrito. Embora seja uma questão de procedimento, o rito influencia diretamente quem terá a última palavra sobre o conteúdo das leis.

A disputa por protagonismo já interferiu em temas como o mercado de carbono e ganhou força na regulamentação do streaming: mesmo com um texto já aprovado pelos senadores, a Câmara optou por avançar com outra versão. Algo semelhante ocorre com a proposta sobre gratuidade de bagagem de mão em voos nacionais — Senado e Câmara analisam projetos próprios, sem conciliação.

O cenário atual contrasta com o início promissor das gestões. Motta e Alcolumbre atuaram juntos para liberar pagamento de emendas, esvaziaram uma medida provisória do governo Lula que afetava o ministro Alexandre Silveira e chegaram a participar de viagens e eventos de forma conjunta. Motta inclusive atendeu a um pleito dos senadores ao restabelecer as comissões mistas de MPs, esvaziadas durante o embate entre Arthur Lira e Rodrigo Pacheco na legislatura anterior.

A harmonia, porém, se desfez após a PEC da Blindagem. Desde então, Motta tem afirmado a aliados que a Câmara seguirá agenda própria, sem necessidade de pactuar movimentos com o Senado. Essa postura se evidenciou nas discussões do projeto antifacção e na escolha de Renan Calheiros como relator da ampliação da faixa de isenção do IR — episódio que reacendeu rivalidades, especialmente com Arthur Lira.

Embora ambos tentem preservar a aparência de normalidade, o distanciamento já interfere no ritmo legislativo e reforça um novo ciclo de competição interna no Congresso.

Adriana Nogueira

Adriana Nogueira

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